Flávia

Por Rogers Silva

Flávia, nome lindo, tu és a flor do meu jardim. Tu és o clichê da minha novela romântica. Tu és lugares comum. O sorriso que me ofereceste, este, aqui está, ó, dentro de mim, da memória e do, sobretudo, coração. Flávia, teu jeito calado, tímido, me mata de morrer, pois me dá vergonha de te dizer-te que, Flávia, quero muito, mas muito mesmo, te amar. Te amar sem jeito. Te amar sem palavras. Te amar sem te amos. Amar, simplesmente amar. Quando ficas próxima a mim percebo: ficas constrangida (será que também queres me amar?). Eu, quero, porém não consigo, te falar, Flávia. Meu Deus, Flávia, por que tudo tem que ser assim, querendo mas não podendo, ou não tendo coragem? Quando passas perto de mim percebo, como não?, que ficas mais tímida que és, sem graça ou, quando tens tempo, com uma cara assim de seriedade forçada (meu Deus, ou será ilusão?). Eu, Flávia, vê se entende, sou assim mesmo, devagar-quase-parando. Tenha paciência. Começou assim (pelo menos para mim) eu te olhando, fisgado, extático, e tu me dando corda, assim, olhando também. Eu almoçando e tu a passar, cabelos curtos e linda, talqual és, Flávia, linda, lindamente morena clara. És tímida ou vives em dilema, assim como eu, Flávia? A andar, quase sempre, sozinha e solitária, sobre meio-fios e ruas universitárias... A estudar, calada e alemãomente (preciso de algumas coisinhas sobre o Porsche, Flávia, e não ria, por favor, não ria, Porsche não é alemão? Me ajude, sim?)... Meu Deus, quando te vi, lá, na sala, naquela sala, assustei, mas fingi, assim, ó, fingi mesmo, or-gu-lho-sa-men-te. Nas sextas-feiras, Flávia, ora ficava, nem que fosse um segundinho só, para te olhar (mesmo sabendo que, pouquíssimo, apenas de relance me olharia), ora me ausentava (por querer) para não ter que te olhar e não... Lembras dos versos escritos no quadro? Flávia, é estranho isso, de escrever idiotices, diriam os cínicos. Esqueçamos essa gente; de gente já tô cansado. Ops, claro que de ti ainda não cansei, até porque... nem te conheço direito! Sorriste para mim, e desse sorriso, a porta se fechando..., surgiu coragem e palavras a serem ditas. Sejam palavras nunca ditas antes, uma vez que palavras sempre-sempre ditas, na maioria das vezes, são mentira, força do hábito. Quero te amar ou, como pretensioso mas humilde que sou, inventar novas formas de amar, ou, quem sabe?, inventar novos conceitos, é!, novos conceitos. Te amo não mais significará te amo, e sim te quero perto de mim, assim, nem que seja para ficar vermelho e não ter o que falar. Estar apaixonado não mais significará estar apaixonado, mas sim tremer, suar, se engasgar quando tu chegares. Topa? Flávia, sou diferente (ou me iludo ser). Uma mulher numa sala de Engenharia cheia de homens com um homem numa sala de Letras cheia de mulher darão certo? Será? É madrugada, Flávia, adoro madrugadas, dormir tarde, ver o que ninguém vê, já que todos estão inertes em suas camas. Adoro ver a vida viver, por si só, e eu a olhar, maravilhado, maravilha!, talqual costumo exclamar. Meu Deus, já são filosofias demais, viagens na maionese. Flávia, não te peço nada além de... Ih, esqueci o que ia te pedir. Não, não te peço nada. Peço que leias isto nem que seja para, logo em seguida, jogar fora, ou mostrar aos amigos (massageia o ego saber que existe uma pessoa querendo a gente) com risinhos, ou guardar (e depois de anos se arrepender ou agradecer a Deus por não ter dado moral ao que aqui ficou dito). Flávia, meu Deus, sei que é estranho te dizer, porém não tenha medo, Flávia, por favor, não tenha medo. Sei dos carinhos mais gostosos, dos beijos mais ardentes ou mais suaves – e usá-los contigo vou ou não, apenas isso, sem mitificações, choros, lágrimas. Embora todo o presente seja feito de eternidade, e eternidade, como a própria palavra sugere, demore pra caramba, apenas cantarei o presente, o aqui-agora, e do presente sai, quase sem querer, seu nome: Flávia. Eu ainda não te amo mas, Flávia, quero te amar.


* Trecho deste texto, Flávia, fez parte do conto A máquina, de minha autoria, publicado no Portal Neuromancer, organizado pelo escritor, ensaísta e agitador cultural Nelson de Oliveira.

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