Meus olhos verdes (parte II)

Por Rogers Silva


* Os três primeiros capítulos do folhetim podem ser lidos AQUI.


4 –

Mais de um mês depois, após as férias, na sala de aula: “Marina – chamou Geisel, virando a cabeça para trás, rumo à cadeira dela.” “O quê?” “Lembra daquela moça que eu conheci um tempo atrás na praça? Aquela sua colega?” “Ah, a Jéssica?” “É.” Eles falavam num tom de voz baixo, pois no momento um homem de óculos dava aula de Teoria da Região e Regionalização. “Você não telefonou pra ela, né. Ê, Geisel – disse Marina. – Mas talvez nem compense... Parece que ela te ligou, mas você não estava em casa.” “E você nem me disse!” “Eu esqueci.” “Qual o telefone dela? Eu vou ligar pra bater um papo... Tem algum problema?” “Uai, acho que não.” “Qual é?” Marina, sem vontade, deu o número do telefone de Jéssica a Geisel.
   
5 –

 “Jéssica?” “Sim, é ela. Quem fala?” “É o Geisel, se lembra de mim?” “Geisel – exclamou. – Claro que lembro! com empolgação. – Que legal você ter ligado. Eu liguei duas vezes para você, mas em nenhuma delas ninguém atendeu. Marina lhe falou?” “Não. Na verdade ela me disse ontem, quando eu pedi a ela o seu telefone. Ah, eu não liguei porque eu perdi seu número.” “Nem vem. Eu não lhe desculpo.” “Que isso! Eu só não liguei porque logo depois que nós nos conhecemos eu perdi seu tel.” “Mentira num tom de brincadeira. – Você não ligou porque não gostou de mim.” “Claro que não foi isso. Até porque se eu não tivesse simpatizado com você eu não te ligaria hoje, não é verdade?” “Hum, vou fingir que acredito. Sua namorada não está aí não, está?” “Não. Quero dizer, eu não tenho namorada.” “Nossa! Um rapaz tão bonito e inteligente como você não tem namorada? Que desperdício!” “Assim você me deixa sem graça.” “Não liga não, eu sou assim mesma. Um pooouco espontânea – irônica. – Me ligou para me chamar para ir ao cinema?” “Você não acha que é cedo demais – falou Geisel, mas logo se arrependeu.” “Parece  que você não é muito aberto a novas amizades, não, né – disfarçou ela, com uma normalidade incrível.” Eis o que mais cativou Geisel: a espontaneidade com que Jéssica conversava. “Me desculpe, eu não quis ser grosso. Quando podemos sair? – contornou Geisel.” “Quando quiser.” Ele estranhava a facilidade com que estava ganhando Jéssica. “Desculpe perguntar, mas quantos anos tem?” “E isso é pergunta que se faça a uma dama? – riu. – Estou brincando. Eu tenho dezenove, e você?” “Eu tenho vinte.” “Pensei que fosse mais velho. Não que pareça fisicamente mais velho, mas você parece ser bem maduro. “Obrigado pelos elogios. Você também parece ser bem legal.” “Só isso! Legal?!” “Eu não te conheço direito pra falar mais, uai. Quem sabe daqui alguns dias não estou te fazendo outros elogios.” “Tomara.” Marcaram de ir juntos e sozinhos ao cinema. No sábado à noite – em três dias –, Jéssica e Geisel sairiam juntos.

6 –
   
Geisel entrou em seu Chevette rebaixado e foi à universidade. Eu não estou com ânimo para estudos – pensava ele dentro do carro em movimento. Ia pela Avenida Segismundo Pereira. Descia. Não, hoje eu não vou à aula – concluiu. Era no momento quase sete horas  a noite, horário em que as aulas começavam. Passou direto pelo campus, que se encontrava no fim da avenida por onde descia. Pegou a avenida João Naves e foi por ela. Passou pela prefeitura da cidade, por um hiper mercado (perto do principal shopping da cidade) e continuou. Pensou em entrar pelo estacionamento do shopping, parar e andar um pouco, mas: “Não, no shopping não” – decidiu. Passou direto. Foi indo, com seu Chevette prateado,
modelo 89, pela João Naves. Só virou quando chegou quase no fim da João Naves, entroncamento com avenida Floriano Peixoto. Quando chegou próximo à praça Tubal Vilela, decidiu estacionar, um quarteirão antes. Desceu do carro e caminhou devagar rumo à praça. Quando lá chegou, escolheu um banco e se sentou. A praça estava quase deserta. As luzes amarelas clareavam o local. É! Quinta feira. Depois de amanhã eu saio com Jéssica. Enquanto isso, aproveitemos... Mas de que maneira? Hum, quinta universitária. Isso! Hoje tem festa universitária no London! – uma boate renomada da cidade. – Começa aproximadamente onze horas – pensava. – Vou ter que esperar... Vou dar umas voltas pela cidade... – Avistara quando chegara à praça uma banquinha de cachorro-quente. Era o que iria fazer: comer cachorro-quente e deixar o tempo passar. Depois... As horas passaram. Deram onze e vinte. Geisel, já dentro de seu automóvel, pensou em ir à boate, logo ali, pertinho. Foi.

7 –

São dez horas da manhã. E ainda Geisel dorme. São dez horas da manhã de uma sexta-feira. Está acordando. Boceja, levanta os braços (estica-os o máximo possível), coloca o travesseiro no rosto, tampando-o. Tira-o e olha o relógio. Sim, Geisel, já são dez e dois... Aparenta estar com sono. Até parece que não dormiu. Nossa, não dormi nada – pensa. Lá no London, conhecera uma garota e foram para o motel. É isso mesmo? Ele bebera muito. Como era mesmo o nome da garota? – não se lembra. Geisel não trabalhava nessa sexta-feira. Em seu rosto um ar de despreocupação. Tenho um trabalho de Geografia política pra entregar. Vou aproveitar e fazer ele hoje. E se der tempo, vou à casa de Andressa... Estou com saudade dela... Foi ao banheiro lavar o rosto, escovar os dentes, arrumar-se, vestir roupa. Depois, faria o trabalho.
    
8 –

Mulata. Cabelos encaracolados, longos, nigérrimos. Sobrancelhas espessas e bem feitas, olhos castanhos. Boca bem delineada, lábios claros. Pele lisissíma, bem tratada. Corpo sensual. Andressa. “Adivinha o que aconteceu comigo? – perguntou ela, sentada no sofá, olhando para Geisel, que estava deitado no outro sofá.” “O quê? – mostrando interesse.” “Fui chamada para ser modelo. Acha que topo?” “Quanto de altura você tem?” “Um metro e setenta e seis.” “Sua altura é boa. Sempre gostei de mulheres altas.” “Bobo – sorriu.” “Não sei... Aqui mesmo em Uberlândia que vai trabalhar?” “Não. Me chamaram para ir a São Paulo.” “É de se pensar. Mas... você iria largar a faculdade?” “Não. Iria transferir.” “De faculdade particular pode transferir pra pública?” “Acho que sim – respondeu ela, se levantando.” “Iria me largar?...” “Deixa eu buscar algo para a gente beber – não respondeu, sorrindo, lindíssima. – O que quer?” “Pode ser um suco, se tiver.” “Vou ver...” Foi ver se tinha um suco (“De laranja ou maracujá? – gritou da cozinha”). Ao chegar, Geisel reparava o corpo da moça, magro, mas nem tanto: peitos médios, barriga sarada, pernas bem torneadas, brilhantes. “Só que vou ter que emagrecer alguns quilos.” Deu-lhe o copo de suco de laranja. Geisel levantou-se para pegá-lo. “Então eu não deixo. Se é pra estragar seu corpo... Um dos mais bonitos que eu já vi, de todas as moças que conheci...” “Pára, se não você me deixa sem graça – falou, voltando a sentar-se no outro sofá.” “E você já ficou sem graça perto de mim? – se sentando também. – Logo perto de mim!” “Já. No começo da nossa amizade. Quando eu dei em cima de você e você não me deu moral.” “Mas naquela época eu tava meio enrolado.” “Naquela época? – ironizou.” Geisel sorriu. Andressa também. Ambos conheciam profundamente o assunto em questão. Ele gostava de ficar conversando com Andressa. Achava-a muito agradável. A amizade dos dois tinha dessas intimidades que os mais desavisados olhariam com malícia. Isso se comprovou quando ela, saindo do sofá em que estava, foi para perto de Geisel e deitou-se no seu colo. “Posso? – perguntou.” “Claro. Você pode tudo... – Geisel respondeu.” Era uma hora da tarde quando o rapaz chegara na casa de Andressa. Agora são sete horas da noite. O rapaz disse que sairia com uma garota. “O nome dela é Jéssica. Jéssica...” “Bonito nome – indiferente, Andressa, olhando-o sem aprovação.” “É... – prolonga, ele, por uns dois segundos a vogal.”
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