Clarissa e a última estrela que explodiu



Filha,
faz poucos anos que você nasceu. Desde então, minha prioridade tem sido você. Não é fácil. Não tem sido fácil. Não lembro da última noite que dormi integralmente. Não faz mal. Se não me lembro é porque não faz falta. Olhar para você, ouvir sua tagarelice, pegar você no colo, ouvir "papai" cem vezes ao dia compensam qualquer cansaço ou falta de sono. Nos últimos anos passei os anos mais difíceis, cansativos e plenos da minha vida. Me descobri pai. Me soube pai. Me percebi completo só quando me percebi - você com alguns minutos de vida reconhecendo minha voz - me percebi pai. Seu pai. Não sou mais professor, revisor de textos, acadêmico ou escritor. Sou papai da Clarissa, e isso me basta. Me basta de verdade. Ser pai não é um mar de rosas. Ser pai da "Tarissa", menos ainda. Ser pai é um abdicar constante. É um exercitar constante. Diário. Necessário. É arrumar forças onde as forças não existem mais. Ser pai solteiro e sozinho é esperar alguém dizer, em algum momento do dia: "Me dá, eu pego ela pra você ". Mas quando acontece, Clarissa, confesso que preferiria não ter acontecido, porque aqueles cinco minutos sem você no meu colo vão me fazer falta, eu sei. Vão te fazer falta. Os braços doem, óbvio, mas o que é dor de braços se comparada ao sentimento de amor que raramente sentimos nessa e em outras vidas, caso existam? "Papai não está bem, mas papai te ama e vai melhorar, prometo" - lembra quando te disse, você no meu colo, eu e você chorando, naquele crise horrível de pânico? Pois é. Papai está melhorando. Papai melhorou. Melhorou para assistir, com você, o brilho da última estrela que explodiu.

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